O Setor Cultural brasileiro enfrentou desafios na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro. Com leis e projetos vetados, a falta de verba prejudicou os trabalhadores e o andamento das setoriais de cultura. Após as eleições de outubro de 2022, com vitória de Lula da Silva, o setor se mostrou esperançoso. Isso porque as promessas do atual presidente do Brasil dizem resolver as urgências deixadas pelo antigo governo.
Desinteresse e projetos vetados no governo Bolsonaro
O governo de Bolsonaro deixou claro que o setor de Arte e Cultura não seria prioridade. O ex-presidente vetou duas aprovações do Senado relacionadas a projetos benéficos ao setor. Como justificativa para a resolução, utilizou o argumento de que as leis não seriam de interesse geral da população.
A nova edição do projeto de apoio ao setor cultural no país, conhecido como Lei Aldir Blanc, foi vetada integralmente. Segundo o Portal de Transparência na Cultura, a lei garantiria o acesso à renda emergencial para os profissionais dos setores cultural e criativo. Também, ao subsídio para a manutenção dos espaços culturais que tiveram suas atividades interrompidas no período da pandemia da Covid-19, e às ações de fomento à cultura, através de prêmios e editais para o setor cultural e criativo.
O setor estima que a proposta atingiria 75% dos municípios brasileiros, gerando cerca de 412 mil empregos. O uso da verba também envolveria a digitalização de patrimônios culturais, aquisição de obras de arte e a construção de teatros, museus e bibliotecas.
Outro projeto vetado foi o da Lei Complementar nº 195, a Lei Paulo Gustavo. O objetivo do projeto era contribuir para que os trabalhadores do setor cultural tivessem condições de superar os efeitos da pandemia. A sua proposta apontou um investimento federal de 3,86 bilhões de reais. Os estados e municípios receberiam o valor, que seria entregue com o intuito de incentivar as atividades artísticas e culturais.
O caso da Cinemateca Brasileira, em São Paulo, é outro exemplo. Em 2021, um incêndio aconteceu na instituição que preserva, restaura e divulga o acervo da produção audiovisual brasileira desde 1940. A gestão da Cinemateca era responsabilidade da Associação Comunicação Educativa Roquette Pinto (ACERP). O contrato com a instituição acabou em 2019, e não foi renovado por Bolsonaro.
Mais problemas ocorreram nas sedes e galpões da Cinemateca, comprometendo parte do acervo. Em julho de 2020, o Ministério Público Federal em São Paulo (MPF/SP) entrou com ação na Justiça contra a União por abandono da Cinemateca, mas suspendeu a ação com a promessa do governo federal de que a situação seria resolvida. Por fim, a manutenção só foi possível por conta da dedicação da Associação Comunicação Educativa Roquette Pinto (ACERP), que se recusou a abandonar o local.

Propostas do governo Lula para a Cultura
É esperado que Lula recupere o setor cultural, que está enfraquecido diante das urgências deixadas pelo governo anterior, entre elas, a crise enfrentada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e a Lei Rouanet. Bolsonaro disse, em uma de suas propostas, que a Lei Rouanet seria direcionada aos artistas de menor porte, mas isso não aconteceu. De 2020 para 2021, a gestão aprovou menos projetos e aumentou os seus preços.
Durante sua campanha para a eleição, Lula falou sobre reconstruir o Ministério da Cultura e sobre a criação de comitês estaduais e municipais para fortalecer as instituições federais, e recompor investimento e financiamento.
Conselho Municipal de Políticas Culturais
Os Conselhos são uma espécie de colegiados permanentes. Eles integram a estrutura básica do órgão da administração pública, que é responsável pela política cultural em cada esfera de governo.
O Conselho Municipal de Políticas Culturais atua na formulação de estratégias e no controle das políticas públicas de cultura e também tem total influência na formulação das leis, inclusive na Aldir Blanc. Como o próprio nome diz, serve como um conselheiro do poder público, e pensa recursos que possam contemplar todas as linguagens da arte. De acordo com Bárbara Damasio, 35 anos, presidente do Conselho de Cultura de Itajaí, “a missão do Conselho é construir um diálogo para que o poder público tenha cada vez mais funcionários da área cultural nas suas estruturas de governo”.
O Conselho tem um papel construtivo e também deliberativo. Sua composição deve ser no mínimo paritária, ou seja, composta por pelo menos 50% de representantes da sociedade civil, eleitos democraticamente, e por integrantes da gestão pública cultural.
O Conselho de Cultura de Itajaí trabalha em parceria com a Fundação Cultural, participa de reuniões e da elaboração dos editais e projetos. A Fundação promove tanto a diversidade cultural como a diversificação dos criadores e públicos dos bens artísticos e culturais.
Desafios enfrentados e o modo de lidar com a situação
Com o corte do Ministério de Cultura, que aconteceu em 2016, no governo de Michel Temer, o setor perdeu várias frentes e editais, segundo o representante da setorial de teatro de Itajaí, Mauro Filho, 33 anos. Ele também afirmou que as Políticas Públicas do setor cultural “basicamente não existiram nos últimos anos”.
Os trabalhadores da área cultural acompanharam um Ministério da Cultura extremamente atuante no fortalecimento da cultura local e regional, da descentralização, e do entendimento da cultura na sua dimensão simbólica, econômica, e cidadã. As entidades e as instituições estavam se fortalecendo e, de repente, o Ministério se tornou uma secretaria.
Não só os artistas são prejudicados com a situação, o setor gera emprego e renda para uma rede de profissionais ligada ao setor cultural. Isso inclui o setor de turismo, hotéis e restaurantes, e até o pipoqueiro que vende sua pipoca em frente ao teatro, nos dias de espetáculo. No setor da música, por exemplo, uma apresentação agrega, além dos músicos, o profissional da iluminação, da técnica de som, figurino, cenário, entre outros. ”Quando tem um corte das leis, afeta uma grande parte da sociedade que depende desse meio cultural”, disse Bárbara Damasio, representante da setorial de música de Itajaí.
Para Mauro Filho, as leis emergenciais de cultura foram fundamentais para a sobrevivência de muitos coletivos e espaços artísticos. Uma delas é a Lei Aldir Blanc, que veio da Câmara Federal dos deputados e depois de muita pressão foi sancionada pelo governo federal. A proposta da lei prevê repasses anuais de R$ 3 bilhões da União para os estados, Distrito Federal e municípios. “Quando eu falo artísticos, culturais, é de produção audiovisual, até o artesanato”, completou Mauro.

Apesar dos benefícios propiciados pela Lei Aldir Blanc, foi necessário fortalecer ainda mais as setoriais das linguagens artísticas e os conselhos municipais de cultura, com a intenção de enaltecer a importância dos recursos para a classe artística. Depois da aprovação de uma lei, é preciso captar os recursos com empresas, através do imposto de renda. Isso acontece com a lei Rouanet e com leis de incentivo à cultura de um modo geral. Os quatro últimos anos serviram para que o setor se unisse ainda mais e fortalecesse o diálogo com o poder público. “A gente lidou com a situação de forma muito mais militante”, afirmou Mauro.
O setor cultural não recebeu nenhum apoio de maneira massiva de instituições privadas durante esse período de desafios. Isso, porque o sistema S, que se refere às instituições administradas de forma independente por federações e confederações empresariais dos setores da economia, também sofreu corte de verbas, o que dificultou a captação de recursos.
O município de Itajaí tem, historicamente, respeito e cuidado pela área cultural. Por essa razão, os artistas da cidade não ficaram totalmente desamparados. As leis de incentivo e os editais continuaram, e principalmente o projeto arte nos bairros, que gera bastante empregos. Mauro comentou que se os trabalhadores do setor dependessem do estado e do governo federal, não iriam conseguir lidar com a situação da mesma forma.


Expectativas para os próximos anos
Para todos, as expectativas são as melhores, visto que o atual governo tem uma promessa com o setor cultural: A retomada do Ministério da Cultura, que pretende reestruturar todas as áreas e reestabelecer as políticas culturais. A esperança é de viver tempos mais felizes, com mais projetos, descentralização, fomento à cultura, à arte, à valorização do artesão e dos artistas das cidades.
Os trabalhadores esperam conquistar o que é preciso para o setor, para que todos tenham acesso aos bens culturais, como aponta a Constituição. “Quando a gente fala de manutenção da cultura e da arte, a gente não está falando só da sobrevivência dos artistas, mas da preservação de um patrimônio, de uma ideia de cultura”, finalizou Mauro.