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Entrevista: Conheça os projetos e planos do Lote 84

Estúdio, galeria de arte e de criação, o Lote 84 surgiu em 2014 e tem um papel fundamental para o movimento da cultura regional. Luciana Siebert, movida pela paixão à arte, decidiu transformar sua casa em um espaço para promover e estimular o desenvolvimento da cultura.

Desde sua criação, o Lote teve um único objetivo, mas não uma única finalidade. O espaço já passou por diversas fases. A princípio, serviu como estúdio fotográfico, como local de feiras e exposições de artes. E hoje, além deste conjunto, depois de perceber que as pessoas preferiam produzir seus próprios quadros e fotografias ao invés de comprá-los, o Lote 84 começou a realizar oficinas.

Com tudo isso, ainda sobra espaço para servir de ateliê para Janaína Gavassa, designer de moda, que possui uma linha de roupas sustentáveis. A criadora do projeto, Luciana Siebert, conta tudo sobre as oficinas, exposições e eventos que integram o projeto.

Todos os eventos e oficinas são divulgados pelo insta: @lote84.

Artista Luciana Siebert

Cobaia: Como você define o Lote? Como uma casa de cultura ou um espaço de incentivo a arte?

Luciana Siebert: Acho que é uma galeria, e um espaço de produção. Produção de arte e pensamento. A gente faz bastante estudo de autodesenvolvimento.

Cobaia: Você tem muitas referências quando se trata de arte. Pode-se dizer que você tem uma visão diferente sobre o que é arte. Você procura trazer para o Lote o que é influência pra você?

Lu: Na verdade eu tenho medo de falar de uma visão muito diferente. Sei o que eu acho interessante. O que me toca. Eu morei em Sampa, em outros lugares, e fora do país muito tempo, então a gente começa a ter outras referências. […] Nós temos parcerias, por exemplo, teve uma (exposição) que foi o Mutart, com a Hyndira Borba em 2014, foi lindo. A gente botou dez artistas aqui que fazem parte da galeria dela, eu convidei outros. Teve a confraria da Colagem também, todos colagistas da região.

Cobaia: Vem artistas só da região ou de fora também?

Lu: Teve artistas de fora! Veio gente de São Paulo para cá, tem gente daqui, de Itapema, por exemplo. Muita gente já trouxe seu trabalho pra cá.

A Gabriela Schmidt que é uma fotógrafa de Blumenau. As fotografias dela são maravilhosas e ela já expôs aqui um trabalho de artes plásticas que ela faz, completamente diferente.

Cobaia: O que mais acontece aqui no Lote, exposições ou oficinas?

Lu: Ambos. Acontecem vários tipos de projetos também de produção de filmes e tal. Agora a gente tem aula de literatura acontecendo. Já teve aula de teatro, interpretação para cinema e novas mídias. Oficina de documentário, oficina de fotografia analógica. Estamos na sétima edição de literatura. Com dois professores diferentes.

Cobaia: Você comentou sobre essa produtora de filmes, como aconteceu isso? Tem ligação com a oficina de produção de curta?

Lu: Eu criei a Pogo Filmes em 2009 e comecei a trabalhar mais com desenvolvimento de projetos. Depois acabei pegando alguns filmes para distribuir. Conheci um diretor, que é o Lufi Bollini, ele tinha um filme genial e não tinha ninguém colocando em festival ou tentando uma distribuição alternativa. E a gente acabou distribuindo. Ganhamos um prêmio com um dos filmes dele. Nós já distribuímos dois filmes dele.

Cobaia: Quais são?

Lu:O Fantasma da saudade no vale da morte” e “O Maré”. Agora nós temos um projeto que é o “Johnny Fever”. Nós ganhamos para escrever o roteiro de uma série do PRODAV, que é um sistema de incentivo do governo federal. Ganhamos R$ 100.000,00 para escrever a série. Esse é nosso projeto maior, em parceria com a Novelo Filmes, de Floripa.

Cobaia: Os filmes são produzidos aqui no Lote mesmo?

Lu: A gente produziu um curta metragem para uma oficina, que nunca foi lançado, o “Maravilhas do Atlântico”. Foi gravado há dois anos, mas “tá” lá todo o material. Não saiu da ilha de edição, mas já está bem editado. Tem projetos que não tem a necessidade de sair tão rápido.

Mas eu trabalho muito com vídeo. No meu insta eu faço muito vídeo experimental e também toda comunicação do Lote, então os vídeos que tem no Lote que são bem viagem, são todos eu que faço.

Espaço do Lote 84

Cobaia: Trabalham quatro meninas aqui, você (Lu), a Janaína, a Fátima e a Vitória, certo? São vocês quem criam as artes que estão expostas aqui? As colagens para o Instagram?

Lu: Tem muito trabalho da Jana, tem algumas colagens minhas, eu acabo fazendo mais colagens para fazer os pôsteres de divulgação das atividades que tem aqui. A não ser que seja um expositor, dai a gente usa a obra do artista. A gente tem um projeto bem legal que é Garage Sale – Art Savage, que abrimos o estúdio pra qualquer artista que quiser vender qualquer coisa. Podia ocupar o espaço e botar suas obras ou compor com móveis ou não. Era bem livre, aberto, a pessoa não pagava nada, e se ela vendesse alguma coisa, 15% ficava para o estúdio. Foi bem livre, veio bastante artista. Veio o Coletivo Ambrosia Cintilante, Berejuk, que é um grafiteiro e artista plástico maravilhoso.

Cobaia: Desde o começo são vocês que trabalham aqui?

Lu: Não. Eu estou aqui sempre, eu moro aqui. A Jana entrou há dois anos. Quando o lote participa de feiras, nós levamos todos os artistas que trabalham com a gente. Muita gente deixa trabalho aqui, tem coisa que é do acervo, tem coisa que a gente bota para vender. No começo era pra ser estúdio de fotografia. A gente estava mais focado em foto. Então tivemos outros parceiros que vinham e frequentavam. Depois teve uma época que a gente fez muito teatro com o Guilherme Fernandes, aqui mesmo no Núcleo Monstro, que nós criamos. É meio que cíclico, as pessoas vão circulando. O Gui ficou aqui por um tempo, agora ele está fazendo novela e outras coisas. E todo mundo sempre tem a possibilidade de voltar. O Ricardo Casarin, foi um dos sócios no começo. O César Martins e o Humberto Furtado, foram as pessoas que lá atrás começaram a vislumbrar comigo, e depois cada um seguiu um caminho.

Cobaia: Então, o Lote sempre foi aqui?

Lu: Sim, quando eu encontrei a casa já sabia que não ia ser um lar. O meu sonho é conseguir fazer girar capital o suficiente para eu poder sair e todo o espaço ficar comercial. A gente tem linhas de pensamento que nós seguimos aqui. Por exemplo, a gente não gosta de vender bebida aqui, já vendemos, mas trabalhamos com outra lógica. Por exemplo, nas exposições ou no Caos Filosófico, você traz a sua própria bebida, porque gera uma outra forma de interação.

Acreditamos muito na questão do autodesenvolvimento, porque nós percebemos que as pessoas buscam muito a espiritualidade. Elas tomam hayuasca, vão para centro budista, vão para o espiritismo, procuram essas espiritualidades e acabam se encaixando em novos conceitos morais. A gente acredita que através do processo criativo literário, pintura, você consegue entrar em contato com a tua sombra, que todo mundo tem, e encontrando um equilíbrio mais humano de autodesenvolvimento.

Cobaia: Agora que você entrou nesse assunto, percebi que as pessoas estão muito em busca de autoconhecimento, você acredita que isso tem a ver com o caos que está o mundo?

Lu: Acredito que sim. Com certeza, a sensação que eu tenho é que as coisas estão andando muito mais rápido. A gente está recebendo as lições, talvez, de uma forma mais dura. Parece que o karma está ali na sequência, tu fez, tu já leva. Então eu acho que as pessoas estão cada vez mais confusas e buscando uma forma de se conhecer. Acredito muito que a gente precisa se conhecer intimamente antes de querer ditar regras, ou levantar uma bandeira do bem se a gente não consegue se enxergar.

Trabalhamos bastante com psicanálise aqui. Entramos com o Caos Filosófico, que é um projeto que a gente tem com o Paulo Ferrarezi. O Caos Filosófico é isso, a gente traz questões, por exemplo, sexualidade, gênero, política, psicologia, psicanálise, e trazemos para uma discussão. Eu gostaria muito que o Lote, na maturidade, conseguisse unir cada vez mais esse serviço. Além da produção artística, ter um aparato psicológico.

Cobaia: Além do Caos Filosófico, quais são as outras oficinas que acontecem aqui?

Lu: No momento a gente está com o projeto de literatura que é Ocultismo, delírio e cosmos com a Isadora Krieger, mas essa aula está acabando. Teve recentemente pintura contemporânea, com o Diego Oliveira.

Parece mesmo que é meio cíclico, a gente pegou uma época do teatro, uma época da pintura. Muito cinema com o Cine Odisséia. Aí eu começo a ver o que podemos desenvolver com oficina a longo prazo.

Cobaia: As oficinas são pagas?

Lu: Depende, tem oficinas que são mais baratas, que são workshop. Depende se o artista vem de fora ou se ele é da região. Essa da Isadora é paga, R$ 280,00 por mês, ela vem de Antônio Carlos. E eu acho que vale super a pena, vejo no que a gente acaba investindo, no que a gente gasta dinheiro. Tem pessoas que para uma calça jeans, 280 não é nada, mas fazer um processo de 16 horas por mês, é muito. Então fica meio confuso, e uma coisa que gente tenta fazer aqui, apesar de querer que tenha livre acesso e promover coisas que são gratuitas, é que as pessoas valorizem o artista. Por que percebemos que o artista se sente muito na posição de “ah, muito obrigada por me convidar pra deixar tua loja de materiais de construção bonita”. Entendeu? As pessoas pegam lojas que não tem um discurso artístico, chamam os artistas, e eles vão supergratos por ter isso, quando na verdade eles estão elevando o conceito de lojas que não tem conceito.

Cobaia: A gente tem essa mania de não valorizar muito o artista, como se o trabalho dele fosse apenas hobby.

Lu: É! E tem a coisa de que a arte tem que ser de graça, cultura tem que ser de graça. Acho que tem que ser, acho que o Estado tem que se preocupar muito com isso. Eu já vi muitas pessoas saírem de buracos depressivos através de processos criativos aqui! Então imagina o que a gente não consegue fazer em bairros que precisam de um incentivo. Eu incentivo todo mundo a fazer colagem, porque para você entrar num processo criativo, na colagem você vê resultado mais rápido. E começa a analisar quais são as imagens que chamam mais a atenção quando tu compõe elas. Tu vai descobrindo equilíbrio, paleta de cor de uma forma muito intuitiva, do que tu botar um papel em branco na tua frente e não saber por onde começar.  A colagem dá uma base muito boa para depois tu começar a pintar e estudar formas.

Cobaia: Você começou a fazer essas colagens como hobby?

Lu: Desde bem novinha eu faço colagem como hobby. É um trabalho maravilhoso, tanto que eu uso a colagem para comunicação do Lote! Consegui vender alguns trabalhos, mas para mim é um grande exercício eu poder fazer os pôsteres, eu vejo minha evolução. Pra qualquer pessoa que queria trabalhar com processo criativo tem que tacar um grande foda-se pra opinião alheia, senão tu não consegues fazer nada.

Cobaia: Já teve uma exposição com as suas colagens?

Lu: Fiz uma exposição na Feira Lunática, e eu nunca fiz uma exposição minha aqui. Um dia eu vou fazer, mas eu sou muito crítica comigo mesma.

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