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Projeto Social Panossi Team: como um policial militar levou os meninos da quebrada para o topo do pódio

Olhos vidrados no oponente. Na face: a água escorre em forma de suor. Os movimentos rápidos, a esquiva, a tentativa de superar o oponente e sair com a glória. Tais condições refletem dois espaços distintos, com personagens diferentes e tramas pouco conflitantes. As diferenças são duas: o espectador e a arte. 

Um dos hobbies do pequeno Fred era ficar sentado na sala de estar em sua residência, localizada em Botucatu/SP, assistindo televisão. Mas ele não consumia qualquer conteúdo, Frederico sempre foi um amante dos filmes que envolviam a temática das artes marciais. Antes de praticar esportes de luta, o menino ficava vidrado com os olhos fixos na telinha. Uma mão segurava o controle e outra a pipoca, tendo a pulsação sanguínea acelerada por conta dos golpes de seus heróis. Jackie Chan, Van Damme, Sylvester Stallone e Arnold Schwarzenegger são apenas alguns que levaram as artes marciais para a televisão. 

Fred observa seus alunos treinando a modalidade de Kickboxing, na academia do Projeto Social. Foto: Felipe Lopes

Cerca de 30 anos depois, o menino Fred não existe mais, pelo menos não publicamente. O garoto viciado nos filmes de luta cresceu e se tornou o head coach Panossi. Em vez de estar no sofá de casa, concentrado nos movimentos das telas, Fred Panossi observa e dá instruções na beira do ringue. O olhar não é mais de contemplação, os olhos se tornaram fixos na obstinação em busca da vitória.

 A sala deu lugar às arenas, como por exemplo, o Ginásio de Tarumã, em Curitiba, onde o adulto Fred viu um de seus pupilos disputar o título de melhor lutador do país em sua categoria. A idolatria deu lugar ao sonho de ver os lutadores que participam do projeto social, que leva o seu nome, no topo. 

A vida de Panossi sempre girou em torno da luta, porém no meio dessa história, entre os embates cinematográficos na televisão e as disputas de seus atletas no ringue, há ainda mais lutas envolvidas.

Dias de luta

Fred (40 anos) mora hoje em Camboriú, cidade que sedia o Projeto Social Panossi Team, porém a conexão Cidade dos Bons Ares/Capital do Mármore teve uma parada no frio curitibano. Após se graduar em Educação Física na sua terra natal, mais precisamente na Faculdade Integrada de Botucatu (Unifac), Frederico decidiu rumar à capital paranaense para estudar no campus da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Lá, ele fez a sua pós-graduação em Fisiologia do Exercício.” Minha ideia sempre foi trabalhar com atletas de alto rendimento. Um dos motivos por que eu fui para Curitiba foi para estudar na Federal e já trabalhar com o alto rendimento, dentro da arte marcial, do kickboxing e do MMA”. 

A luta levou Panossi de Botucatu até Curitiba e da Capital Ecológica até Camboriú. No entanto, a chegada na Capital do Mármore não teve a ver com disputas dentro de ringues e tatames. Frederico veio para Camboriú enfrentar a criminalidade, um inimigo mais sanguinário, onde a disputa não garantiria apenas uma medalha, mas sim, a vida de vários cidadãos – e a sua própria existência. 

Após concluir a pós em Curitiba, Panossi foi aprovado no Concurso Público da Polícia Militar de Santa Catarina. Após passar pelo treinamento de soldado por nove meses na Academia de Polícia Militar da Trindade, em Florianópolis, Frederico foi lotado para a 3ª Companhia do 12° Batalhão, localizada em Camboriú, no ano de 2011. Desde então, passaram 12 anos, Frederico se casou, subiu de patente, mas não desistiu do seu amor pelas artes marciais. Na verdade, a realidade policial só fez ele fortalecer o seu sonho para trabalhar com a luta. 

Fred Panossi, membro da Polícia Militar de Santa Catarina.
Foto: Fred Panossi / Divulgação.

Então, através do meu serviço militar, eu vi que os jovens estão muito vulneráveis nessa faixa entre os doze e dezesseis anos.  Eu comecei a realizar esse projeto para poder estar contribuindo com o desenvolvimento deles, de uma forma positiva, sem estar tendo que usar o uso progressivo da força e aplicar a lei marcial como mecanismo para afastar eles do crime e também interagir com a sociedade

contou Fred Panossi sobre como idealizou o Projeto Social Panossi Team, em entrevista á Felipe Lopes

O desenvolvimento do sonho Panossi Team

“É, não é fácil, até porque a carga horária, né? Da Polícia Militar são doze horas. Então, muitas vezes eu saio da polícia e ainda tenho que vir dar aula. Mas é como eu disse, né? É algo que eu já tinha idealizado antes de ser policial também”. Quem vê o sucesso do projeto com as medalhas e títulos conquistados talvez não perceba o quanto a caminhada até o pódio foi difícil. 

Com o objetivo de tirar adolescentes de baixa renda da possibilidade de entrarem no mundo do crime, nasceu o Projeto Social Panossi Team. O projeto utiliza as artes marciais para promover valores como disciplina, respeito e autocontrole. O projeto foi iniciado em setembro de 2021, mas as ideias de criá-lo começaram 11 anos antes, quando Fred ainda morava em Curitiba e fazia pós-graduação em fisiologia do exercício, com o objetivo de, posteriormente, dar aula. Após chegar ao ápice de aprendizado no Kickboxing, conquistando a faixa-preta, Fred decidiu abrir a academia de artes marciais voltada aos jovens de Camboriú.

Por conta da alta demanda, Fred alugou uma nova sala com o dobro de tamanho para atender aos 110 alunos que atualmente participam do projeto. O professor estima que durante quase dois anos de projeto, já tenham passado cerca de 240 alunos no Panossi Team. O projeto social vai além das aulas destinadas aos adolescentes. Ele proporciona palestras de conscientização ao não uso das drogas. Também há a presença de pastores que visitam a academia para trabalhar o lado espiritual dos jovens e um cabeleireiro que, uma vez por mês, corta o cabelo das crianças de forma gratuita. Em datas comemorativas, Fred toma a frente para recolher cestas básicas e destinar às famílias das crianças do projeto.

Com troféus e cinturão ao fundo, Fred observa e orienta seus alunos em aula de Kickboxing, na academia do Projeto Social. Foto: Felipe Lopes

O projeto recebe estritamente alunos de 7 e 17 anos, que estudam na rede pública e que possuem, ao menos, 75% de frequência, tanto na escola quanto no projeto. As aulas contemplam três modalidades de artes marciais: Kickboxing (tendo a aula destinada para crianças menores), Taekwondo e MMA (artes marciais mistas). Adultos também podem participar da academia, mas com treinos à noite e pagando uma taxa. O Panossi Team é apoiado por empresas do comércio de Camboriú e Balneário Camboriú, que ajudam a viabilizar financeiramente o projeto idealizado pelo policial militar de Santa Catarina. A Fundação Municipal de Esporte de Camboriú dá o transporte para a equipe de Fred fazer viagens para competir.

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Dias de glória

Toda a luta de conciliar uma jornada de 12h como policial militar, enfrentando a criminalidade, e ser o treinador de talentos, instruindo jovens habilidosos, vêm trazendo bons frutos ao paulista de Botucatu. Recentemente, a Panossi Team conquistou bons resultados no cenário estadual e nacional das artes marciais. 

No 14° Sul-Brasileiro Open de Artes Marciais, os lutadores do Projeto Social Panossi Team conquistaram dois cinturões e duas medalhas de prata no kickboxing. Também, na 2° Etapa do Campeonato Catarinense de Muay Thai, eles conquistaram duas medalhas na categoria Juvenil Masculino até 57 kg. Outro grande resultado foi no Campeonato Catarinense de Kickboxing. A equipe conquistou três medalhas de ouro e duas de prata. 

Porém, a grande consagração da equipe camboriuense veio entre os dias 8 e 11 de junho de 2023. Na ocasião, dois atletas de Camboriú ficaram entre os melhores lutadores de kickboxing do Brasil. Na disputa do 32° Campeonato Brasileiro da modalidade, Willian Uriel e Gabriel Borschett subiram ao pódio. William conquistou a medalha de prata na categoria Kick Light, já Gabriel garantiu o bronze no Light Contact. As conquistas vieram na primeira vez que a Panossi Team participou do Brasileirão de Kickboxing. Outra curiosidade é que o resultado expressivo veio logo em Curitiba, uma das cidades centrais no roteiro de vida de Frederico. 

Além das medalhas, o vice-campeão brasileiro de William Uriel garantiu a ele uma vaga no Campeonato Panamericano de Kickboxing de 2023. Ele irá compor a Seleção Brasileira que disputará a competição continental em dezembro na cidade de Foz do Iguaçu, no Paraná.

Fred acompanha Will, Kaue e Gabriel em Campeonato Brasileiro de Kickboxing. Willian ficou com a medalha de prata na categoria Kick Light e Gabriel com o bronze na Light Contact. Foto: Projeto Social Panossi Team/ Divulgação.

Uriel é um dos orgulhos do coach Panossi. Um dos momentos marcantes foi quando o jovem perdeu a avó mas não se abalou e manteve a rotina de treinos.“ Uma coisa que me marcou nesse ano foi com a avó do William Uriel, ela veio a falecer na quarta-feira e um dia depois foi o velório. Já na sexta, o Willian veio treinar e no sábado ele conquistou o cinturão de ouro no boxe de 54 kg. Aí ele demonstrou a responsabilidade com o projeto, o seu interesse e mostrou que realmente ele quer ser campeão, independente da adversidade que a vida impor sobre ele”. 

As conquistas do Projeto Social não ficam apenas dentro do ringue. O trabalho feito por Panossi está sendo reconhecido publicamente. Fred foi lembrado durante a sessão solene de entrega de moções de congratulações à personalidades de Camboriú, A premiação foi realizada pela Câmara de Vereadores em julho de 2022. Na ocasião, Panossi recebeu o prêmio por indicação do parlamentar Ewerson Umbelino (PL). Segundo a Câmara, ele foi gratificado pelo: “trabalho que vem realizando no projeto, desde a sua fundação em 2021, ensinando gratuitamente artes marciais e bons princípios para crianças e adolescentes carentes de Camboriú, formando campeões através do esporte”.

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